O que queremos do estado? As limitações das abordagens atuais
Main Article Content
Resumo
Os ensaios sociológicos de Max Weber há muito definiram o Estado moderno como necessariamente coercivo. Caracteriza-se pelo monopólio da protecção armada – e portanto da violência – dentro de um território ou um país. Hoje esta definição do Estado é largamente partilhada entre sociólogos e cientistas políticos. Mas o conceito de Max Weber, relacionado com um certo relativismo, foi vítima ou inspirado por uma epistemologia que o levou a convencer-se que os propósitos do Estado não podiam ser racionalmente examinados e que os ideais, a que chamou “valores”, estão fora do alcance da ciência, quer os dos canibais quer os dos liberais. Robert Nozick chegou por um caminho muito diferente a uma conclusão análoga: o Estado legítimo (mínimo) deve ser apenas um agência de protecção da vida e propriedade que tende a ser monopolista e servir de enquadramento a muitas utopias e “valores”; a neutralidade ou indiferença do Estado é a melhor garantia do florescimento de diferentes formas de vida. Neste texto tentámos explorar os argumentos de ambos os autores e mostrar os pressupostos e narrativas em que baseiam as suas ideias. Um breve confronto com narrativas alternativas muito mais antigas da legitimidade da coerção, que remontam à antiga polis, recordou-nos que os clássicos acreditavam que o seu propósito era favorecer a excelência humana e não se limitava a constituir uma arena que oferecesse uma protecção política aos agentes do mercado. Não podemos regressar aos clássicos, nem endossar a sua visão. Mas não há razão para não examinarmos diferentes concepções do Estado moderno. De facto, o Estado raramente é neutro e cabe-nos decidir se os seus recursos devem ser canalizados para proteger o mercado ou proporcionar os meios para a busca da felicidade, ou uma mistura de ambos, ou de nenhum destes propósitos. Um obstáculo a uma análise mais profunda parece ser a presunção comummente aceite de que o pluralismo é incompatível com o “perfeccionismo”, i.e., que o descrédito ou o afastamento do Estado do favorecimento de toda e qualquer concepção da vida boa é a única, ou pelo menos a melhor, garantia do liberalismo. A melhor garantia do liberalismo, segundo alguns autores, não é a tolerância de diferentes modos de capturar a verdade ou o respeito das luzes nas mentes dos outros, mas a ausência de verdade ou de convicções tanto no domínio moral como político. Com efeito, se o Estado é essencialmente um poder protector, coercivo ou violento, talvez seja preferível que seja indiferente à educação, às artes, a investigação científica ou a todas as formas de vida boa. Queremos sugerir que tal presunção merece ser clarificada.
Downloads
Referências
Beyme, Klaus von. "The Role of the State and the Growth of Government", International Political Science Review / Revue internationale de science politique, 1985, Vol. 6, No 1: 11-34.
Cabrita, Maria João. "O Liberalismo, a Justiça Social e o Papel do Estado: As Propostas de John Rawls e Robert Nozick", Tese de Doutoramento, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, 2007.
Cohen, G. A. Self-Ownership, Freedom and Equality. Cambridge: Cambridge University Press, 1995.
Gaus, Gerald. "Explanation, justification, and emergence", In The Cambridge Companion to Nozick's Anarchy, State and Utopia, edited by Ralf M Bader and John Meadowcroft, 116-142. Cambridge: Cambridge University Press, 2012.
Hailwood, Simon. Exploring Nozick: Beyond Anarchy, State and Utopia. Aldershot: Avebury, 1996.
Holmes, Robert L. "Nozick on Anarchism", Political Theory, 1977, Vol. 5, No 2: 247-256.
Kelsen, Hans. General Theory of Law and State. London: Transaction Publishers, 2007.
Lacey, A. R. Robert Nozick. Princeton: Princeton University Press, 2001.
Locke, John. (1988). Two Treatises of Government. Cambridge: Cambridge University Press.
Mack, Eric. "Arguments for the more-than-minimal state," In The Cambridge Companion to Nozick's Anarchy, State and Utopia, edited by Ralf M Bader and John Meadowcroft, 89-115. Cambridge: Cambridge University Press, 2012.
Miller, David. "The Justification of Political Authority", In Robert Nozick, edited by David Schmidtz, 10-33. Cambridge: Cambridge University Press, 2002.
Nozick, Robert. Anarchy, State, and Utopia. Oxford: Basic Books, 1974.
Paul, Jeffrey. "The Withering of Nozick's Minimal State", In Reading Nozick: Essays on Anarchy, State, and Utopia, edited by Jeffrey Paul, 68-76. Oxford: Blackwell Publishers, 1982.
Rothbard, Murray. The Ethics of Liberty. New York: New York University Press, 1998.
Strauss, Leo. The City and Man. Chicago: University of Chicago Press, 1964.
Ullmann-Margalit, Edna. "Invisible-hand Explanations", Synthese, 1978, Vol. 2, No 39: 263- 291.
Weber, Max. "Politik als Beruf" In Gesammelte Politische Schriften, edited by Johannes Winckelmann. Tübingen: Mohr Siebeck, 1988.
Weber, Max. General Economic History, trans. Frank H. Knight, Mineola (NY): Dover Publications, 2003.
Williams, Bernard, "The Minimal State," In Reading Nozick: Essays on Anarchy, State, and Utopia, edited by Jeffrey Paul, 27-36. Oxford: Blackwell Publishers, 1982.
Winckelmann, 'foreword" Max Weber to Wirtschaft und Gesellschaft, (Tübingen: Mohr Siebeck, 1972), XXVIII-XXXI.
Wolff, Jonathan. Robert Nozick: Property, Justice, and the Minimal State. Stanford: Stanford University Press, 1991.
Wolff, Robert Paul, "Robert Nozick's Derivation of the Minimal State," Arizona Law Review, 1977, Vol. 19: 7-30.