Um cartaz espantando a multidão: António Ferro e outras almas do modernismo banal

Main Article Content

Luís Trindade

Resumo

«A alma de António Ferro é um cartaz espantando a multidão», garantiu o próprio Ferro no prefácio que escreveu para a sua Teoria da Indiferença, em 1920. Ferro era, no início dos anos de 1920, o autor mais visível do processo de vulgarização do modernismo após Orpheu: nessa altura, um modernismo banal foi-se formando em jornais, magazines e novelas populares. O uso constante de metáforas familiarizou o público com uma série de tropos que pretendiam descrever em que consistia a vida do século xx. No essencial, tratava-se de uma insistência em imagens sobre a frivolidade e a sofisticação da mulher («as bonecas são os livros das mulheres») e sobre a modernidade tecnológica («a arte é a luz eléctrica da vida»), sobretudo no que dizia respeito às novas máquinas de reproduzir imagens. Ferro não estava só enquanto poster: o papel couché era o «ecrã dos magazines», as novelas podiam ser «kodaks instantâneos», enquanto Madame Film, personagem de outro livro de Ferro, tinha um «corpo em film, todo movimento». Este artigo pretende sugerir que os jogos metafóricos entre as palavras e as imagens foram um momento decisivo num processo mais geral de mudança na hegemonia política do campo cultural, em que precisamente as imagens desafiaram o poder tradicional das palavras. Quando Ferro garantiu, como novo director da Ilustração Portuguesa, em 1921, que o seu magazine inventaria Lisboa, estava simplesmente a iniciar um processo no qual Portugal seria reinventado através de imagens, como ficaria claro, na década seguinte, com a propaganda do Estado Novo.

Palavras-chave: Modernismo, Cinema, Hegemonia, Imprensa, Civilização escrita

Downloads

Não há dados estatísticos.